A INUTILIDADE E A CONTRAPRODOCÊNCIA DOS CASTIGOS NA EDUCAÇÃO
Por. Faustino Moma Tchipesse
Professor, pesquisador e escritor
OPINIÃO
Na sala de aula regista-se, historicamente, a presença de um conjunto de regras que devem ser obedecidas para que o processo ensino-aprendizagem se desenvolva, configurando-se como um acordo, escrito ou tácito, que orienta as relações entre os alunos, professores e a comunidade educativa. Esta norma disciplinar está disposta em políticas educacionais e políticas de gestão e organização institucional em particular da sala de aula, pois elas tornam os professores num facilitador/ moderador e mediador desse contrato pedagógico, em que os conflitos precisam ser evitados, a submissão garantida, estabelecendo-se padrões comportamentais e normas a serem seguidas pelo professor.
É mister considerar o castigo como «uma pena que se impõe ao menor como consequência de acção ou inibição que os professores, os Pais e Encarregados de Educação-PEE consideram incorrectas. Por ser uma atitude contradocente é fundamental que se crie coragem de responder as perguntas em áugures de provocação académica, como: que papel o professor cumpre quando opta pelo castigo como forma de disciplinar o aluno?
No nosso entender “simplificado”, quando o professor castiga o aluno, propõe-se que está corrigir um determinado comportamento, já que associado às sanções são fontes de desprazer, pela qual o menor os deve evitar no futuro. O professor é um agente de mudança de comportamento, todavia precisa saber que a repreensão do aluno pelas faltas ou erros cometidos no processo de ensino-aprendizagem, ou mesmo a dificuldade na memorização do ponto, da vírgula, do acento, da ordem dos números, da motivação de fazer ou não as tarefas, não pode resultar em castigos severos, pois os regulamentos das instituições devem repor os elementos práticos que conservam o princípio dos direitos da criança, consagrado na agenda internacional sobre o Direito das Crianças (1989).
Importa ressaltar que no sistema de educação angolano de (1976 a 1978), conservava-se o antigo critério do ensino colonial, porém o Estado procurou fazer várias reformas a fim de buscar novas tendências educacionais, por isso, optou por uma política com direccionamento vertical em 1989 (Etapa do diagnóstico do sistema educativo), as insuficiências registadas a nível das estruturas do sistema educacional, as incongruências dos planos de estudo (não solucionava o desenvolvimento multifacético dos alunos), a falta de programas das disciplinas (tal facto pressuponha a falta de preparação adequado do corpo docente), estiverem no centro das grandes atrocidades dos professores na sala de aula.
Foi assim, que o Ministério da Educação entendeu apresentar uma proposta de lei da educação (Lei n.º13/1) por ser uma medida que exigia olhar para os verdadeiros ângulos que pudessem nortear uma educação sustentável, levou aos angolanos perto de dez anos para a sua aprovação, pois a Lei premiava uma orientação pedagógica sustentada na base de um ensino de qualidade com base numa perspectiva progressista, apoiada na CHAVE (conhecimento, habilidades, atitudes e valores). Passado quinze anos, o MED apresentou como proposta a Lei n.º17/16 de 7 de Outubro, visto que a Lei anterior, após o diagnóstico e consequentemente a apresentação do relatório da 2ª reforma educativa em 2014, apontou várias irregularidades e estrangulamentos que não permitiu a sua continuidade, facto que levou a rever os padrões sociais, com isso optar por aqueles que permitissem desenhar uma política educativa enquadrava nos reias desafios do país.
A lei defende que os castigos são meios pedagógicos importantes para manter a ordem em sala de aula […],ou seja, o castigo era considerado um artefacto pedagógico que outorgava: a punição através de palavras e de penitência e pelo uso de instrumentos como a palmatoria (comummente chamado de maria das dores), o chicote ou a disciplina a mangueira, o bastão que poderia ter 10 à 12 polegadas e na última das hipóteses o aluno poderia ser expulso da instituição atendendo a gravidade das suas manobras dilatórias. Diante desta cultura disciplinar e de punição a educação absorvia seus pressupostos e tornava-os presentes na forma de prémios e castigos, nos processos de verificação da aprendizagem.
Reiterando a discussões sobre a pratica dos castigos na educação, apresenta a ilustração de uma sinete de uma escola angolana nos finais do século XX e princípios do século XXI em que podem notar que era comum considerar a vara como instrumento para manter a ordem e a disciplina “quem poupa a vara não gosta dos seus alunos” nesta época entendia-se que a criança aprendia da melhor forma quando a mesma esta assustada (condicionamento operante). Entretanto, entendia-se que o uso da violência física/verbal era necessário para a manutenção da disciplina e da ordem na sala de aula, pois era uma prática legítima e coerente na visão dos professores tradicionalistas. A lei n.º32/20 de 12 de agosto é bastante conservadora, para isso o legislador levou em consideração a sua experiencia e usou o seu saber para construir princípios pedagógicos a favor dos alunos. Na óptica do legislador, a correcção dos alunos pela vara, não pode ser visto como uma forma de preservá-la da sua própria natureza.
Com essa consideração, queremos problematizar o porquê da presença de instrumentos físicos e prática de punição na educação ao longo dos trinta e dois anos (32), como permanência histórica avessa ao acto educativo em angola e a uma cultura de paz. Para tal, é nosso propósito reflectir sobre políticas de controlo e prática disciplinar utilizadas na educação, apontando contribuições de políticas educativas embaçadas na CHAVE em direitos humanos como caminhos para humanização dos sujeitos educativos.
Nesse sentido, apelamos a construção quotidiana de uma prática pedagógica em educação em direitos humanos, fortalecida por políticas de direitos humanos a fim de contribuírem para uma cultura de paz na sala de aula, encerrando uma história que desconsiderava a dignidade que buscava controlar os corpos e as mentes dos alunos.
No momento actual, dificilmente escutamos os professores a falarem em castigos ou punições na sala de aula. Ouvimos, na verdade, falar em indisciplina dos alunos, na dificuldade de organizar os alunos insurrectos sobretudo antes e durante as aulas. Percebemos, de antemão, que no contexto diversificado na sala de aula, «que não apenas o professor deve ser responsabilizado pela indisciplina dos alunos, tal como era feito no passado, mas que culpabiliza-lo, demos articular as questões pertinentes que resultam de tal comportamento com os outros sujeitos e factores a ele inerentes».
Ora, importa referir que a abolição dos castigos da edução, deixou algumas lacunas na prática disciplinar dos alunos. As formas de controlar/supervisionar as aulas não mais funcionam com equidade e pedagogia preventiva da disciplina, desmoronou-se.
Hoje, o olhar dos professores ou seus gestos como forma de retorquir o comportamento dos alunos, entre outras formas de coerção presentes na sala de aula, não conduzem os alunos a ordem e a obediência. A concepção de que a retirada dos castigos na educação pela disciplina e controle dos corpos contribuiria para a organização da sala de aula não encontra suporte pedagógico e nem efectivação, numa era de evasão cultural, promovido pelas médias. Compreendemos que não existe uma fórmula nem receita pronta, para a resolução da questão, com isso, apelamos os professores a reverem suas práticas educativas, pois o exercício docente em angola «é um fazer e refazer-se constante».