AS LÁGRIMAS E O SILÊNCIO DE BORGES MACULA

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Era uma noite tranquila em Luanda, o tipo de noite em que o vento sopra histórias esquecidas e as ruas cochicham segredos. Sentado à margem de um café, BORGES MACULA olhava para o vazio. Os olhos, profundos como um oceano, carregavam uma tristeza que só quem sonhou grande em terra pequena poderia entender.

BORGES não era apenas um ator; ele era um narrador de almas, um contador de sonhos. Cada gesto no palco era um grito por esperança, cada fala, uma oração por reconhecimento. Ele era daqueles que faziam o impossível parecer fácil. Mas, no país do esquecimento, talento não é mérito, é um fardo.

“Se vendesse minha alma ao sistema, talvez fosse reconhecido”, pensou, sem amargura, mas com a resignação de quem entende as regras sujas de um jogo que nunca quis jogar. Bajular, beijar mãos que oprimem, vestir a máscara de um oportunista político – não, isso não era para ele. Sua dignidade valia mais que qualquer aplauso comprado.

Enquanto isso, a cidade seguia sua rotina de indiferença. Governantes que zombavam da juventude, chamando-a de preguiçosa, enquanto sentavam sobre os tronos de suas contradições. Um país que exportava talentos para os aplausos estrangeiros, mas importava mediocridade para governar.

BORGES suspirou. Valeria a pena emigrar? Deixar a terra que o moldou, ainda que não o acolhesse? Ou seria melhor ficar, resistir, mesmo que isso significasse definhar na miséria?

Na mesa ao lado, um poeta observava. Ele o conhecia bem, mas não pelas apresentações teatrais ou pelos monólogos emocionantes. Conhecia-o porque Borges era o reflexo de muitos. Era a dor de um país que tem tudo, mas escolhe o nada.

“BORGES”, pensou o poeta, “você não é preguiçoso. Você é grande demais para um sistema que vive de esmagar quem tenta crescer.”

Naquele instante, o poeta decidiu que não deixaria o silêncio prevalecer. Escreveu sobre Borges, sobre os tantos outros jovens cujas almas foram ofuscadas pela indiferença. Sua escrita era um grito, um basta à hipocrisia que transformava heróis em esquecidos.

A noite seguia, mas algo mudava. Não no país, mas no coração do poeta. Porque contar a história de Borges era lembrar que, apesar de tudo, o talento nunca será calado. Ele pode ser ignorado, menosprezado, até esmagado, mas, como as ondas do mar, sempre voltará.

BORGES MACULA levantou-se. No fundo, ele sabia que o reconhecimento verdadeiro não vinha de medalhas ou aplausos vazios. Ele vinha da certeza de que vivera fiel a si mesmo, mesmo em um país que não sabia como amá-lo.

E o poeta, assinando sua crônica, murmurou:
“Borges, você é um monumento em terra de cegos. Mas até os cegos, um dia, aprenderão a ver.”

in Lamúrias del Ukwanana
Crônicas soltas nas vésperas de NATAL.

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