Angola: entre a águia e o dragão
A imprensa noticiou recentemente uma visita do presidente dos Estados Unidos Joe Biden a Angola, no dia 14 de outubro. Mas qual é o significado dessa visita, uma vez que ele será o primeiro presidente a visitar Angola desde a visita do ex-presidente Barack Obama? É verdade que Obama visitou Angola quando já não era mais presidente, o que torna a visita de Biden a primeira visita de um presidente americano a Angola, em razão dessa aproximação com João Lourenço. Mas fica o questionamento, qual é o significado dessa visita?
Sabe-se que antes da visita de Biden, o PR João Lourenço cancelou uma viagem à República Popular da China, um procedimento atípico que pode causar atrito diplomático com o país que mais investe em Angola, o que geraria uma crise diplomática com efeitos a serem sentidos na economia.
Avaliando o que está acontecendo, pode-se ter certeza de que João Lourenço tomou uma decisão bastante ousada, ao escolher como parceiros os EUA, em vez da China, que reconstruiu a ferrovia do Corredor do Lobito. O que teria levado o PR a tomar tal decisão? Será que é necessário reduzir tão drasticamente os contatos com a China, que tanto tem investido na economia angolana? A política externa de João Lourenço também voltou as costas para o BRICS, mesmo com o apoio do Brasil para a aceitação de Angola no bloco econômico que em sua versão aumentada envolve diversas outras economias que mantém um status de neutralidade na política internacional. O que leva João Lourenço e seu partido a terem tanto interesse na aproximação exatamente com os Estados Unidos? Por que mesmo a proximidade com o Brasil e os investimentos da China não pareceram atrativos a JLo?
Nos últimos 10 anos só a República Popular da China investiu cerca de 12 bilhões de dólares em Angola, e esse país asiático é o maior parceiro de exportação e importação de Angola. Foram as empresas de lá que apoiaram a reabilitação de até 2.800 quilômetros de ferrovias; a melhoria de 20.000 quilômetros de estradas; a construção de 100.000 unidades habitacionais; e mais de 50 hospitais no país. Será que isso foi esquecido pelo governo de Angola? Até 2027, a China planeja investir mais de US$ 50 bilhões no desenvolvimento da África, investimento que faz parte de um programa de longo prazo. E o que planejam os EUA para Angola?
Os investimentos dos EUA estão relacionados com os duvidosos programas da USAID, que seguem certos objetivos que vão muito além da economia – eles também estão atrelados a programas políticos obscuros e que podem causar muita turbulência política e social em alguns países. Oficialmente os americanos falam em aumentar o volume de negócios, em desenvolver o setor elétrico e ajudar a combater a pobreza, porém tais programas não tem um grande orçamento e até agora representaram apenas promessas de investimento, sem factos e realizações concretas.
Sobreviveriam eles a uma mudança presidencial na Casa Branca? O que se sabe é que os EUA têm uma forte presença no mercado de hidrocarbonetos do país, visto que a Exxon Mobil, a Chevron e algumas outras já investiram e planejam investir bilhões de dólares em projetos de produção de petróleo. Fora dos setores de produção de petróleo, o investimento dos EUA em Angola é mínimo, com uma exceção – o desenvolvimento do corredor do Lobito, projeto bastante duvidoso e que poderá receber menos investimentos caso Donald Trump seja eleito presidente dos EUA.
Independente de qual será o desfecho da visita de Joe Biden, do ponto de vista geoestratégico, há que concordar que João Lourenço dá um passo bastante ousado, ao trocar “o certo pelo duvidoso”, um país que fez grandes investimentos em Angola, a China, por um país que até o presente momento apresentou apenas promessas, os Estados Unidos, podendo essa decisão se tornar no futuro um faux pas do qual Angola não beneficiará.