MERENDA ESCOLAR: Uma proposta pedagógica para reduzir custos e promover a cidadania nas comunidades

 

 

 

Faustino Moma Tchipesse

Professor, Pesquisador e Escritor

OPINIÃO

 


A educação é um processo planificado e sistematizado de ensino e aprendizagem que visa preparar, de forma integral, o indivíduo para as exigências da vida individual e colectiva e se desenvolve na convivência humana, a fim de ser capaz enfrentar os principais desafios da sociedade especificamente na consolidação da paz e da unidade nacional.

A educação “é um instrumento de promoção dos direitos da pessoa humana e do ambiente”, ou seja, é um meio que garante processo de desenvolvimento científico, técnico, tecnológico, económico, social e cultural do país, tal facto tem a sua concretização na Lei de Bases da educação e ensino vigente em Angola.

A Lei de Bases do Sistema de Educação e Ensino (LBSEE n.º32/21) aplica-se ao conjunto de estruturas, modalidades e instituições que constituem o sistema de educação e ensino em todo território nacional e tem por base a constituição da República de Angola, a Estratégia Nacional de Desenvolvimento-END e as políticas Nacionais da educação-PNE.

O sistema de educação e Ensino tem como objectivo: desenvolver harmoniosamente as capacidades intelectuais, laborais, cívicas, morais, estéticas, éticas, físicas e o sentimento patriótico dos cidadãos, especialmente, dos jovens de maneira continua e sistemática e elevar o seu nível científico, técnico e tecnológico, a fim de contribuírem para o desenvolvimento socioeconómico do país (Lei n.º32/20 & Lei n.º17/17).

Na linha dos princípios gerais do Sistema de Educação e Ensino-SEE, reitera-se o princípio da legalidade, integridade, laicidade, universalidade, democraticidade, gratuitidade, obrigatoriedade, intervenção do estado, da qualidade de serviços da educação e promoção dos valores morais, cívicos e patrióticos e da língua de ensino.

Sendo assim a «educação é tudo aquilo que pode ser feito de forma intencional e planificado com fim último de desenvolver o ser humano e gerar mudanças de comportamentos», representa a instrução e o desenvolvimento de competências e habilidades. No artigo 11 da LBSEE no seu n.º2. o legislador apontou a necessidade de o Estado criar condições para que os alunos que frequentarem o ensino primário nas instituições público-privadas e privadas tenham acesso ao material escolar, designadamente, os manuais escolares em regime gratuito.

Para o efeito do disposto do n.º3 do art.11, a lei deixa clara que o “Estado, enquanto pessoa do bem, deve criar condições e os requisitos de apoio social, nos domínios dos transportes escolares, saúde e merenda escolar, sendo prioritários os alunos cujas famílias se encontram em situação de maior vulnerabilidade podendo os alunos que reúnam os requisitos candidatarem-se”, nos termos da Lei (LBSEE n.º32/20).

A agenda 2030 também chamada agenda (pós – 2015) apresenta estratégias e objectivos claros que tencionam o desenvolvimento Sustentável. A elaboração da agenda 2030 teve a sua génese no período do lançamento do documento final da conferência das Nações Unidas (ONU) sobre o Desenvolvimento Sustentável, pois este encontro ficou marcado de forma indelével com a máxima «o futuro que queremos» (ONU, 2012). Este documento também reafirmou as obrigações relacionadas com os ODMs e demais responsabilidades globais, tal acção abriu possibilidades para construir as bases que norteariam os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável-ODS.

Entretanto, com comprometimento social do legislador, sentimos a tradução dos ideais sociais, económicos e históricos irmanados na LBSEE. O proeminente legislador, ao traçar as políticas pedagógicas, reiterou a necessidade de o Estado assumir as questões de alimentação dos alunos do ensino primário, sobretudo aqueles que vivem em situação de vulnerabilidade, tal intenção faz-nos entender que as políticas educativas estão concatenadas com as orientações científicas sustentadas no campo da Sociologia da educação, Filosofia da educação, Psicologia da educação, Biologia e Anatomia. Este olhar do legislador é extremamente interessante e bastante comovente, pelo facto levar em consideração a situação socioeconómica das famílias angolanas.

A alimentação constitui uma das variáveis de percurso de estrema importância para o desenvolvimento integral dos alunos, com um elevado poder de influenciar no processo de socialização do sujeito. Comprometemo-nos falar da merenda escolar pelo facto de entendermos a sua utilidade no processo de estabilidade emocional dos alunos, assim como os contrapesos que resultam da ausência deste bem consagrado na Lei. As análises em torno disso vão além da Pedagogia, Didáctica e Metodologia. Ela encontra suporte científico na Psicologia de aprendizagem e na Filosofia da Educação.

As nossas discussões têm como escopo a realidade social e económica das famílias angolanas. A Analise é real e contextual. Para não generalizar, assumimos falar de Luanda por ser a capital do pais e o centro dos problemas. Em Luanda é visível a desatenção dos políticos nas matérias de distribuição da merenda escolar. Por serem conhecidas as dificuldades que enfermam a capital, os políticos têm tendência de permanecerem nos discursos e prometerem resolver o problema de forma paulatina. Esquecem-se de que alguns municípios de Luanda (Cacuaco, Viana, Icolo e Bengo e Quissama) ainda conservam alguns retractos que anunciam a necessidade da intervenção do Estado no acampamento social e económico das famílias, por causa do elevado número de famílias vulneráveis. A radiografia feita pode dar maiores níveis percentuais de um diagnóstico bem apurado e que poderá ajudar o Governo a propor medidas racionais de resolução de tais problemas. Desta forma os ideais da educação terão como base um prognóstico bem elaborado pelos técnicos e profissionais da educação.

Naqueles municípios o sector da educação vive os seus últimos suspiros, pois entre o real e o contextual existe um grande divórcio e diante de tais atongoko, os gestores tem encontrado enormes dificuldades para ensaiar as novas práticas de distribuição da merenda escolar, uma vez que o que recebem é insuficiente para dar resposta a demanda. Se fixarmos os nossos olhos de forma clínica e pedagógica para os municípios de Viana, Cacuaco, Icolo e Bengo e Quissama, perceberemos, de antemão, algumas incongruências em alguns distritos e comunas, nos critérios de selecção das escolas que estão cadastradas para recepção e distribuição da merenda escolar.

A «merenda escolar ajuda no processo de transformação sustentável do aluno em construção social decorrente da abordagem dos conteúdos sobre jurisdição da escola». Dada a sua importância, acreditamos ser relevante responsabilizar as direcções municipais na aquisição e no fornecimento da merenda nas escolas, e estes devem assumir os princípios de contratação das empresas que terão a missão de produzir e confeccionar os alimentos.

Ecce homo tem sim atongoko. Se for desta forma então podemos admitir que: etali tu li nilãnilã, pois a política de contratação das empresas para confeccionar os alimentos mostrou-se-nos elevados níveis de burocracia, carregados de vícios, incoerências e descontextualizações. Este modelo inaugurou uma nova forma de legitimar a corrupção, o nepotismo e a bajulação temas que representam as linhas de força das políticas do Governo do Presidente João Manuel Lourenço.

Se fixarmos os nossos olhos na lupa de quem escreve, veremos que o ampliar da pupila despertará a vontade de alertar os Governantes de que a metodologia utilizada actualmente de distribuição da merenda escolar é um autêntico fracasso. Quando os responsáveis da educação são chamados a reflectir sobre seus reais papéis na promoção de uma educação de qualidade e de confiança, o discurso que aparece é o seguinte: “apesar das circunstâncias sociais e económicas que o país tem passado, o Executivo tem feito tudo para garantir que as famílias em situação de vulnerabilidade sejam assistidas de acordo com abrigo da Lei. As administrações municipais têm descarregado os esforços necessários para garantirem que os alunos não desistam das escolas por causa da fome. Todavia, as instituições já estão orientadas para a criação de condições através das Direcções Municipais de Educação, e as Administrações, no âmbito da implementação do Programa de Desenvolvimento Local e Combate a Pobreza, têm garantido a todos o direito de uma educação básica, baseada nas políticas públicas do Governo e da agenda Mundial sobre educação e direitos Humanos”.

Sendo assim, as escolas têm recebido apoios a nível das administrações, das empresas locais a fim de garantirem que as crianças não passem fome e que a merenda escolar seja uma garantia inquestionável nas escolas primárias cadastradas a nível das direcções municipais de educação.

Numa conversa minúscula e desinteressada com um encarregado de educação, fomos questionadas da seguinte maneira: será que o que se ouve sobre as políticas de produção e distribuição da merenda escolar não se traduz em mera falácia ou a prática do discurso em Angola?

Pergunta muito pesada, senti que ela não tinha padrões de resposta e não poderia responder uma vez que a política do sistema de avaliação não aceita a correcção ou análise pontual de questões sem respostas coerentes, por ser assim, simplesmente me calei. Nestes termos e noutros de direito não alienável, gostaria de ter miopia ou astigmatismo para não encarar a sério alguns discursos que lesam a ética e moral das famílias vulneráveis e anda em contramão com o direito e a justiça social.

Não se estuda com fome, ela apaga a mente e pode anular o sonho de uma criança que lhe foi inculcado a ideia de uma Angola próspera e um futuro melhor, pois os adultos já lhe anunciaram que ele é o devir na nação.

O futuro é agora e o aluno deve ser partícipe da construção dos ideais de um futuro melhor (paz, democracia, trabalho e liberdade). Uma criança que está exposta aos conteúdos durante cinco horas, o equivalente a seis (6) tempos lectivos multiplicado por quarenta e cinco minutos, tempo que dura uma aula, teremos duzentos e vinte cinco (225) minutos de aula (5x45min) por dia, e apenas teve um jantar a mil maneiras. Esta sobrecarga de matéria que recebe pode fazer com que ela não consiga memorizar os conteúdos ensinados pelo professor, visto que, naquele momento, o cérebro estará a receber pouco oxigénio, e isso pode criar um apagão na sua mente e desactivar os sensores de aprendizagem.

Os estudos mais recentes apontam os seguintes elementos como principais consequências da inexistência da merenda escolar: (i) a fuga de crianças das salas de aula; (ii) o insucesso escolar; (ii) O desequilíbrio emocional; (iii) pouca capacidade de percepção dos conteúdos e entre outros. A falta dela acaba sendo um factor determinante do incentivo para a presença dos alunos na sala de aula.

A completa claridade e serenidade e até exuberância de espírito que a LBSEE reflecte, na sua linha 3 do art. 11 no ponto n.º5, não se harmonizam com os discursos dos políticos. No nosso entender, existe uma profunda debilidade epistemológica (resultante do desconhecimento sistemático do funcionamento da fisiologia de um aluno com fome colocado numa sala de aula para aprender). Temos de perceber na prática os níveis de sofrimento destes alunos, se associarmos aos quilómetros percorridos para chegarem à escola. Viana, Icolo e Bengo e Quissama são municípios que traduzem as realidades sociais dos alunos que percorrem longas distâncias para chegarem às suas escolas, pois os dados apontam para tal facto.

No meio do martírio provocado pelos legisladores, os professores admitem a ininterrupta dor de cabeça durante os duzentos e vinte e cinco minutos por dia ao ensinarem os alunos que saem das suas casas com fome. Importa ressaltar que essas incongruências têm causado vómitos mentais violentos aos docentes, todavia, os professores tem procurado formas de manterem a sua lucidez dialéctica e serenidade a fim de assinar a excelência e com isso meditar friamente para garantir que os alunos aprendam. A falta de merenda escolar promove nos alunos perturbações doentias no intelecto e as experiências vividas em algumas escolas apontam para a necessidade de uma intervenção urgente.

Ao fazermos uma leitura gradativa da situação económica e social do país, encontramos meios para ajudar o Estado com algumas ideias sólidas que podem acabar em um projecto político de desenvolvimento sustentável (PROPOSE-Projecto Político Sustentável de Educação). Ele tem como objectivo “Definir métodos e estratégias de produção de bens alimentares e distribuição da merenda escolar com os alimentos resultante do campo. Para efeito, é imperioso o envolvimento dos alunos, pais e encarregados de educação” sobre orientação das escolas e supervisão de uma equipa especializada da direcção municipal da educação. Os Poucos recursos podem servir para alavancar a produção e massificar a distribuição da merenda escolar nas regiões em que a agricultura é sustentável (Cacuaco – “alguns Distritos”, Viana “alguns Distritos”, Icolo e Bengo e Quissama, pode ser generalizado).

Este projecto poderá ter maior sustentabilidade naqueles municípios, distritos ou comunas que mais se adequam com os padrões sociais e económicos sustentados na base da agricultura. São aqui mencionados algumas preposições de alcance científico, metodológico e filosófico tidos pelo protagonista como a verdadeira inovação dentro da valorização dos bens alimentares de produção local, baseada nas eruditas épocas do ano. Acompanha os apontamentos que alinham a nossa conclusão:

  1. Concordáramos que a implementação da merenda escolar e, consequentemente, sua gestão continuem a ser da responsabilidade da administração municipal com envolvimento das direcções municipais da educação (sem objecções), mas acreditamos que a centralização desta política tem sido um dos maiores calcanhares de Aquiles dos directores de escola, sem esquecer os poucos recursos disponibilizados para atender uma legião de crianças que respondem as objectivações deixadas na LBSEE n.º32/20 & Lei n.º17/16. para isso, seria bom a apresentação de uma proposta em que vigora a política de cada escola criar a sua própria lavra e garantir a produção dos alunos de acordo com as necessidades da escola. Estes devem receber apoio das direcções municipais;
  2. A lei aponta para a necessidade de priorizar as zonas com maior vulnerabilidade, uma vez que os recursos são insuficientes. Esta observação choca com os princípios que norteiam a LBSEE, e aponta para uma tendência de despreocupação com as linhas que o legislador sublinhou no art. 11 da lei e fere com os direitos humanos consagrados na constituição da república de Angola (não podemos legislar algo e não responder com os objectivos das intenções criadas por falta de recursos, isso significa que não foi feito um bom diagnóstico). Desta forma, apelamos ao Ministério da Educação a fim de utilizar os poucos recursos que a educação tem para merenda escolar para as políticas locais de produção de alimentos de campo, resultante dos esforços dos alunos. Certamente, isto ajudará a rentabilizar as escolas por meio de pequenos campos agrícolas, geridas pelos directores de escolas e supervisionada pelas direcções municipais, com apoio directo das empresas locais (distribuição de insumos agrícolas, entre esses a compra de sementes, fertilizantes, mangueiras, enxadas e catanas e outros meios de trabalho);
  3. Que o financiamento da merenda escolar não seja apenas do OGE, tal como orientam alguns documentos, mas também dos pais e encarregados de educação, empresas locais ou pessoas individuais que se revem nas políticas de combate a fome e a pobreza (ENE,2018);

Estas conclusões foram afirmadas no Encontro Nacional da Educação em 2018. E das recomendações deixadas, marcou-nos a linha g. (ENE, 2018,p.73) que diz o seguinte: «introduzir os produtos de produção local no menu, para facilitar os hábitos socioculturais e emponderamento das famílias”.

Tais intenções estão no sexto (6) painel que tem como epígrafe: Experiência e desafios em educação no quadro do desenvolvimento sustentável. Neste ficou marcado o primeiro grupo temático “ Merenda escolar”, é fundamental que se crie uma política de alimentação escolar em alinhamento com as agendas para a melhoria da qualidade de ensino, ou seja, a merenda escolar deve estar direccionada em duas vertentes: (i) rural e (ii) urbana.

O cumprimento escrupuloso das orientações emanadas na Lei n.º202/19 Lei da Administração Local do Estado, onde encontramos as competências e responsabilidades dos gestores públicos (Governadores, Administradores e Directores municipais), fica claro que os objectivos propostos em Setembro de 2015, data em que foi lançada a nova agenda sob lema: “Transformando o nosso Mundo”; a agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável estabeleceu-se 169 metas e 17 objectivos para o Desenvolvimento Sustentável, entre os quais temos:

(i) acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares;

(ii) Acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e melhoria da nutrição e promover a agricultura sustentável; […]

(xii) assegurar padrões de produção e de consumo sustentável;

(xvii) Fortalecer os meios de implementação e revitalização a parceria global para o desenvolvimento sustentável.

A ODS 4 visa assegurar a educação inclusiva e equitativa de qualidade e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos, está directamente voltado para o tema da educação e é composto por sete metas de resultados e três de insumos:

(i) até 2030, o Estado deve garantir que todos os meninos e meninas completem o ensino primário e secundário gratuito, equitativo e de qualidade e que alcancem resultados de aprendizagem pertinentes e efectivos;

(ii) até 2030, o Estado deve assegura que todos os meninos e meninas tenham acesso a um desenvolvimento de qualidade na primeira infância, cuidados e educação pré-escolar, de modo que estejam prontos para o ensino primário.

Ao finalizar, esperamos ter despertado no leitor, uma sensação de frustração. Esperamos ter-lhe apresentado algo que, aos olhares amiúde, lhe pareça lógico e carregado de bom senso; mas ao mesmo tempo algo que muitos considerarão como longe da realidade.

Essa realidade é questionável, uma vez que está longe do bom senso. Cabe-nos resumir o essencial numa palavra de finalização e de chamada à racionalidade: a educação de qualidade tem custos elevados, estes devem ser entendidos como investimento no futuro. O amadurecimento dos frutos do trabalho educacional leva muito tempo e, quando amadurecem, quem os come nota que são bastante carnudos e suculentos e deixam água na boca pedindo a qualquer um para os saborear, pois até as sementes são doces e cheirosos.

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